É inegável que o fim do século XX, e o início do século XXI, são do feminino. A perspectiva do feminino moderno tem eido vista e revista. Hoje estamos mais do que abertos à visão da mulher sobre a sociedade em termos tanto sociais quanto espirituais! O sagrado feminino se recuperou de anos de perseguição daquilo que historicamente chamamos de patriarcado. Vale lembrar, entretanto, que o patriarcado foi nocivo para o homem tanto quanto foi para a mulher.

Se a mulher perdeu a sua liberdade e espontaneidade, o homem perdeu o contato com sua alma, a capacidade de acreditar na sua intuição, sepultou suas emoções e hoje é um desconhecido para ele mesmo. Na recuperação do feminino houve quase que uma demonização do masculino. Os homens passaram a ser o modelo a ser superado. Por um lado, tudo bem, a evolução é assim mesmo, mas por outro lado o que se ofereceu em troca? As mulheres passaram a assumir o seu lado de guerreiras, foram à luta, brigaram por seus direitos, foram trabalhar… E o lado guerreiro dos homens, bem mais agressivo que o das mulheres, como ficou? Teve de se contentar com academias militares ou de vale tudo (técnica de luta também chamada de MMA). Em ambos os casos criou-se soldados e lutadores, em parte, e por outro lado assassinos de guerra e espancadores de minorias! A culpa, obviamente não é de nenhuma das academias, mas do fato que a psique masculina não tem recebido a devida atenção. Qual é o papel dos homens na moderna sociedade? Enquanto essa questão não for esclarecida continuaremos vendo o que recheia de sangue os noticiários: pais assassinando filhos e esposas ao serem rejeitados, cometendo crimes quando o seu time perde… Isso tudo são os frutos de guerreiros que não encontraram a luz e a sua função nesse mundo.

Quando não são maridos que têm de manter sua casa, o que muitas vezes nem se faz mais preciso, são homens solteiros, que treinam para se tornar predadores sexuais. Em ambos os casos podem exagerar, tornando-se possessivos com suas mulheres, e seu sucesso profissional, ou excêntricos sexuais que podem muito bem dar vazão a compulsões pouco ternas, para não dizer violentas.

Os que não se encaixam nos extremos pairam pela vida como um bando de zumbis perseguindo velhos papéis sociais de conquista material e aventuras amorosas até que a crise da meia idade caia, como uma bomba, em suas vidas!

Os homens precisam saber quem são no fundo de si mesmos, honrar seus papéis culturais como pais e companheiros, mas também descobrir outros! Explorar novos campos de atuação deixando de lado preconceitos e temores. Não temer sua intimidade, nem a abordagem da sua sexualidade de um modo mais humano e humanizante, o que não significa ser casto, ou castrado, mas sim ser verdadeiro e consciente.

A grande crise que vivemos é uma crise masculina, uma crise de identidade onde os heróis são ou cantores de RAP, ou jogadores de futebol, e ambos pararam no tempo! Tratam as mulheres como objetos de consumo, empunham armas, carros de luxo e apoiam soluções violentas para a criminalidade. Em outras palavras são a mais clara exemplificação da falta de novos papeis para a masculinidade. São trogloditas com grossos cordões de prata no pescoço.
O homem involuido está preso a um tempo que ainda sobrevive nas malhas do moderno capitalismo. Nesse mundo a vida ainda é dos homens que possuem dinheiro para consumir, e manter um caro estilo de vida. E os homens comuns?… Olham para esse ideal como gatos em frente a uma peixaria, dispostos a tudo para adquiri-lo, ser parte dele!

É preciso que se resgate o contato com a essência masculina e que se dispa a consciência dessa ideia de que apenas o homem consumidor tem valor. O fracasso deve ser mostrado como uma etapa natural no processo de crescimento ou troca de estágios na evolução de qualquer um! Homens, via de regra, são educados para nunca falhar, seja no sexo, no trabalho, nas relações!… E o pior é que as mulheres tendem a esperar isso de seus companheiros. A pressão social sobre as mulheres diminui, possuem direitos garantidos por lei, mas e a pressão social sobre os homens?

Uma sociedade só é realmente justa e progressiva quando seus membros desfrutam das mesmas oportunidades de desenvolvimento, não apenas social e econômico, mas também afetivo e consciencial. Há uma campanha do governo federal pela saúde do homem, que de modo ainda limitado fala sobre cuidados médicos e acidentes de trânsito. Com certeza isso é muito importante, mas os homens precisam mais do nunca dar uma boa olhada dentro do coração, e os que tiveram mais ousadia, contemplar a sua alma!

Jaime E. Cannes

Publicado no jornal VIVA BEM, Julho de 2010.