Labirintos – Caminhos para o Sagrado
Os labirintos são símbolos pagãos encontrados em todos os continentes tanto entre os povos tidos como primitivos, como os navajos da América do Norte, como entre os gregos e os indianos! Suas formas circulares nos remetem ao útero materno e ao interior da terra, ou de nós mesmos! O labirinto de sete voltas (abaixo à esquerda) vem a ser o mais difundido dentre todos, aparece em todo o planeta. Mas qual seria a função original dos labirintos? Eis a questão! Tudo o que se tem são hipóteses. As que mais me agradam são as que mostram o labirinto como uma imersão em si mesmo, um encontro com a sombra, ou uma simulação da morte em vida.
Assim como na morte entramos no labirinto mergulhando no desconhecido, a entrada da cova. Ao encontrar o seu meio estamos integrados no si mesmo, e a partir daí a segunda parte da jornada é a saída para a luz pelo útero da mãe terra! O movimento externo libera uma energia psíquica interior de resolução. A moderna psicologia descobriu através de sucessivas experiências que, se entrarmos num labirinto com uma dúvida ou questionamento, ao sairmos a resposta aparecerá! [Um exemplo: Isto é] Se a aceitaremos ou não é outro processo, mas ela vem.
A igreja católica se apropriou deste antigo símbolo, dando-lhe um significado mais “cristão”. Para os cristãos franceses os labirintos eram chamados de Chemin de Jérusalem, ou Caminho de Jerusalém.
E em igrejas como Chartres e Reims os peregrinos tinham de perfazer seu trajeto de onze voltas de joelhos. O onze estava associado ao pecado por ser o número que excedia aos dez mandamentos sagrados. Essa forma de peregrinação aludia à subida de Jesus ao Gólgota, onde ao chegar, e antes de expirar na cruz, ele encontra o seu Deus. Por isso a saída dos labirintos nos templos cristãos era defronte ao altar, para simbolizar esse encontro com o Divino.
Os labirintos medievais encontravam-se sempre no portal oeste das igrejas. O lado onde o sol de põe, o quadrante da purificação. O labirinto de Reims era angular e foi destruído em 1768 porque o clero irritou-se com as brincadeiras de crianças dentro dele, e isso lembrava antigos ritos pagãos como os que eram feitos a Dédalo e Ariadne [Na antiga Grécia faziam-se danças dentro dos labirintos em homenagem a Dédalo, o grande inventor, e a Ariadne, a rainha de todos os labirintos]. Além do que folguedos não combinavam com a postura sisuda da igreja na época.
Uma antiga lenda grega falava que no palácio de Cnossos o rei Minos sacrificava todos os anos vinte rapazes e vinte moças para um monstro terrível com corpo humano e cabeça de touro, o Minotauro. Sua fome insaciável o tornou muito temido. A besta era filho da esposa de Minos, Pasifae, com um touro ofertado pelo deus Poseidon ao rei como uma prova da aliança que fora realizada entre eles. Poseidon tornaria Minos o rei mais rico do mundo e após ter feito isso ele levantaria um templo em nome do deus dos mares e devolveria o touro.
Entretanto, o animal era fabuloso! Era branco mármore, com chifres polidos como madeira, ele ainda tinha uma joia encrustada bem no meio de sua cabeça que emitia um brilho capaz de ser visto a quilômetros de distância. O ambicioso rei o quis para si. Injuriado Poseidon resolveu dar-lhe uma lição, fez com sua rainha se apaixonasse pelo touro e essa pediu a Dédalo, o maior inventor e arquiteto que o mundo conheceu, para que construísse uma vaca de madeira, onde Pasifae entrou para copular com o animal.
Dessa união nasceu o Minotauro, a vergonha do palácio de Cnossos. Mais uma vez Dédalo é chamado para construir um labirinto com a finalidade de manter o monstro lá dentro e impedir que suas vítimas fugissem. E assim foi até o jovem herói Teseu ser mandado pelo senhor dos mares para acabar com aquilo. Ofereceu-se como vítima, mas com a ajuda de Ariadne, que usou uma linha para ajudá-lo a encontrar a saída, Teseu mata o Minotauro, liberta o povo do temor do monstro e sai da armadilha criada por Dédalo. Nesse momento Poseidon fez tremer a terra e levantou ondas imensas para destruir o palácio do ambicioso e traidor rei de Creta.
A luta de Teseu contra o monstro de Minos tem muitos significados. Em termos psicológicos é a luta do homem com sua besta interior, seus instintos e apegos escravizantes. Em termos espirituais é o embate constante pela integração do aspecto humano-animal com sua intrínseca natureza divina ou espiritual. É interessante notar também que Poseidon é o Netuno da astrologia, o planeta da dissolução das ilusões materiais para o encontro com o aspecto transcendente ou místico da vida! Já o próprio rei Minos é referido muitas vezes como um mito relativo ao signo de touro… Cujo significado básico é a busca da segurança pelo acúmulo de bens e recursos monetários.
O tarot, enquanto linguagem simbólica, também pode ser visto como um labirinto. Ao nos depararmos com suas complexas imagens, nos sentimos desorientados a princípio. O conjunto de seus símbolos pode parecer desorientador para um não iniciado, mas com o tempo a jornada simbólica revela-se tornando possível o reconhecimento da trajetória de toda a humanidade bem como as vivências individuais.
Até mesmo para o leitor experiente há uma sensação de mergulho na complexidade, mas ao organizar suas imagens em um sistema compreensível de leitura chega-se a uma síntese que faz um sentido absoluto! Proporcionando um acesso imediato a uma verdade que seria impossível por outros meios. Esse relance súbito e revelador de uma verdade incognoscível é arrebatador para a consciência, estimula a psique e faz com que o intérprete se sinta estranhamente conectado a algo muito maior que ele mesmo. O que equivale à saída para a luz.
O arcano de A Lua é o que melhor expressa essa imersão no labirinto interior. Abandonados na mais absoluta escuridão, e sem nenhuma referência do que devemos fazer ou para onde devemos ir, só nós resta confiar na vida, em Deus, ou no absoluto. Ao fazermos isso encontramos a luz do próximo arcano O Sol, caso contrário podemos passar até anos nas sombras do décimo oitavo arcano do tarot nos perguntando coisas como: “Por quê?” Ou “Como?”.
No baralho Motherpeace, Vicki Noble e Karen Vogel desenharam a imagem de A Lua com uma mulher negra num lago à noite com a água pela cintura. Ela tem de atravessá-lo às cegas como os morcegos que rodeiam sua cabeça. Mais uma vez a água aparece como um símbolo do inconsciente e da memória profunda. Ela está rodeada por fantasmas (Seus medos) e ao longe podemos ver o barco de Caronte, o condutor das almas. Indicando o seu temor da morte ou de qualquer fim súbito e infeliz. Ao pé da figura, em frente a mulher, aparece um labirinto e no alto da figura do arcano, onde tradicionalmente apareceria a imagem da lua crescente, surge uma cabeça de mulher perfilada, é Ariadne. Aquela que confiou nas próprias habilidades para sair do emaranhado interior.
Publicado no Clube do Tarô em Fevereiro de 2012