Sete Mitos Modernos sobre o Tarot
Uma após outra as gerações tentam de algum modo, derrubar os mitos da geração passada. Esse processo é muitas vezes necessário e importante já que as crenças populares somados à cultura de um tempo criam muitas superstições que toldam a verdadeira natureza do saber. Por outro lado há o intrigante fato de que sempre que se derruba um mito, ergue-se outro. Como disse C.G. Jung “Mais cedo ou mais tarde tudo se transforma no seu contrário”, ou seja, acabamos por nos tornar aquilo que combatemos. Por isso aquele que luta por uma verdade e por esclarecimento pode acabar criando uma sombra tão tenebrosa quanto a que ele mesmo combatia. Como em todos os temas humanos vejo também na tarologia esse tipo de coisa ocorrer.
Muito dos mitos modernos criaram-se para derrubar alguns tabus que impediam a linguagem dos arcanos de se tornar mais fluida, mas como a ambivalência é da natureza humana, acabaram virando mitos às avessas justamente porque estreitaram, de algum outro modo a compreensão do tarot, ou seja, viraram os novos tabus! Outros mitos vêm da velha hipocrisia humana, algo como “Faz o que eu digo, mas não faz o que eu faço”. Outros ainda são só uma jogada de marketing mesmo, uma forma de vender um serviço, um curso, ou um livro que acaba distorcendo e restringindo um tema de domínio universal como a tarologia, para as opiniões de uns poucos autores e ou professores.
Selecionei sete mitos modernos, e escolhi esse número porque o sete sugere um aprimoramento, uma possibilidade de questionamento e revisão. Há, é claro, muito mais do que sete tabus perturbadores sobre a prática tarológica, mas acho que esses que selecionei se encaixam muito bem na moderna mitologia do estreitamente da visão.
1º) Tarólogos não são adivinhos
Eis o meu mito preferido! E gosto dele por já ter me surpreendido com muitos tarólogos que alegam que o tarot definitivamente não é um instrumento divinatório mas um meio de investigação do inconsciente humano, mas que acabam fazendo parte dos painéis, aqui mesmo no Clube do Tarô, para as previsões relativas à Copa, às eleições, ao ano novo… e assim por diante! O grande equívoco aqui é o de negar que todos os sistemas oraculares possuem, intrinsecamente, uma tendência tanto preditiva, quanto adivinhatória! Por isso, muitos dos combatentes da adivinhação com o tarot acabam fazendo previsões para o fim do ano.
Duvido muito que em consultório eles não se defrontem com
Uma adivinha
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perguntas do tipo: “Mas como vai ficar essa relação?”, “Posso investir nesse projeto?” e quando isso acontece o que eles fazem? Desfraldam o repertório junguiano em cima do cidadão ou cidadã?
Aqueles que tentam dissociar tarot de advinhação não querem em cima dos seus ombros o peso da distorção que a palavra sofreu! Adivinhar vem de divinar, ou seja, unir o divino e o mundano, o prático e o subjetivo, sem pender exclusivamente para um lado nem para o outro, realizando a aliança entre o interno e o externo. Isso sim é um trabalho verdadeiramente holístico, e é perfeitamente possível.
2º) Tarólogos não são cartomantes
Esse é demais porque simplesmente nega o óbvio! Imaginem que eu fiquei os últimos vinte e dois anos da minha vida jurando que o tarot é um baralho de… cartas! Já pensou?… Agora falando sério, aqui caímos de novo no preconceito que a cartomancia divinatória sofreu ao longo dos anos numa sociedade cada vez mais cerebral e menos intuitiva, cada vez mais material e exterior e menos espiritual e interior.
O termo mância vem do grego e uma das suas traduções é arte, portanto, uma das definições possíveis para cartomancia é “a arte das cartas”. Criar a divisão tarólogos x cartomantes cria inevitavelmente uma comparação e uma disputa velada. A profundidade de um trabalho independe do baralho que se usa, mas do uso que dele se faz aliado à visão de cada cartomante. E como já disse o meu amigo Emanuel J. Santos, historiador e tarólogo: “É fato que nem todo o cartomante é um tarólogo, mas todo o tarólogo é um cartomante!”.
3º) Tarólogos não são bruxos
Essa alegação é bem estranha, soa quase como uma regra ou condição, mas é totalmente falsa! As duas coisas não são excludentes. A bruxaria é uma religião primitiva de milhares de anos que cultiva a comunhão com a natureza e se utiliza dos oráculos para reflexão e adivinhação. O tarot é um instrumento perfeitamente compatível com suas crenças, embora seja verdade que nenhum deriva do outro. Quanto à afirmação de que tarólogos não são bruxos, sugiro apenas cautela, pois novamente o que poderia ser apenas um termo de esclarecimento pode virar uma cartilha do que somos (ou devemos ser) e do que não somos, como um regulamento, além de correr o risco de criar a velha oposição dos egos (algo tipo tarólogos x bruxos). Sim há tarólogos que são devotados bruxos, ou wiccanos, e há seguidores da religião wicca que não se interessam pelo tarot! Simples assim.
4º) O tarot não precisa de rituais para ser utilizado
Na linha racionalista que está sendo difundida nos temas espirituais, esotéricos, holísticos ou ocultos esse é um dos mitos mais curiosos. Quero dizer em princípio que eu concordo com essa afirmação assim como ela é colocada aí em cima. Não é o baralho de cartas que precisa dos rituais, somos nós. Somos nós que sofremos as influências do nosso meio, cultivamos preocupações e nos perturbamos com isso. Pensemos um pouco sobre o fato de que para nos exercitarmos é aconselhado um aquecimento. Antes do amor, preliminares e jogos sensuais! Antes da meditação é preciso centrar e acalmar a respiração… Minha pergunta é: Por que motivo um trabalho que mexe com símbolos da alma humana, e a psique das pessoas não precisaria de preparação?
Ritos para leitura
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Os rituais são meios pelos quais nos despimos dos afazeres mundanos e das preocupações ordinárias para entrar em contato com uma dimensão mais interior e receptiva do ponto de vista psíquico. Uns se utilizarão de meios mais elaborados para cumprir sua interiorização, outros ainda farão orações, acenderão velas, incensos, ou desenharão símbolos mágicos no ar, outros apenas limparão a mente e respirarão algumas vezes antes da consulta, ou qualquer outra coisa que ajude a atingir a parte mais profunda de si mesmos. Todas essas práticas são rituais!
Os ritos são todos válidos e necessários sim. No contato com as cartas mergulhamos em nós mesmos e depois no outro e isso não é uma experiência qualquer. Como toda a atividade humana precisa de preliminares de algum tipo antes de sua execução, e duvido muito que alguém não se utilize de uma prática desse tipo, mesmo sem saber o que está fazendo!
5º) É preciso estudar muito para interpretar o tarot corretamente
Esse é o mito que se criou para combater os tarólogos que alegavam que ler as cartas era um dom ou que herdaram isso de algum familiar mais velho que já executava a atividade. Mais uma vez proponho um olhar para o meio, existem sim pessoas que depois de muito estudo e prática conseguem ler o tarot, outros apesar de pouca leitura e conhecimento sobre técnicas de tiragem, são exímios em captar as mensagens dos arcanos. A taróloga e escritora Cynthia Giles em seu livro Tarô uma História Crítica, assinala que há os chamados leitores psíquicos, pessoas que se utilizam das cartas apenas como um trampolim para acessar a chave inconsciente daqueles que os procuram. As duas coisas são possíveis, e alguns terão que esfregar o nariz nos livros por muito tempo, ou o resto da vida, e outros acessarão essa linguagem de modo fluido.
É importante que não se sucumba a tentação do ego em tentar saber quem tem mais méritos, a meu ver ambos o tem! Um já nasceu com ele e o outro o conquistou! Tanto o leitor mediúnico, ou psíquico, quanto o analítico intelectual ocupam o seu lugar na vida e tem sua função. As conclusões a que ambos podem chegar não tem como ser diferentes, afinal a vida de quem se consulta é uma só! O que muda são os métodos e as terminologias que encontrarão, cada uma, a sua própria audiência. As duas abordagens são necessárias e haverá aqueles que preferem embasamento teórico e aqueles que confiarão mais em guiança mediúnica, e ponto final!
6º) Qualquer um pode aprender tarot
Esse é um mito do capitalismo, afinal como é possível vender um curso se o público não acreditar que a matéria é acessível? Quero ressaltar que nesse caso eu também concordo com a afirmação assim como ela foi apresentada anteriormente, qualquer um pode entender a jornada dos arcanos e relacionar ela com a própria jornada humana pela vida, tirando disso muitas lições para o seu próprio desenvolvimento, agora daí a dizer que se formou um tarólogo… Comparo com a arte do desenho, ora todos nós podemos aprender a desenhar, desde criança esse é o primeiro gesto criativo! Mas quantos de nós aprenderão a desenhar como Da Vinci, ou Picasso? Ou num comparativo mais próximo, quantos dos que desenham razoavelmente bem tem seu trabalho reconhecido, fazem exposições, vendem e vivem da sua arte?… Pois é, como qualquer outra atividade humana o tarot requer talento sim, pois sem isso teremos só intérpretes medíocres. Como um desenhista que só aprendeu a fazer o homem palito da infância e que o apresenta às pessoas arrematando com a pergunta: “Não é lindo?”
Para os que me indagam de como saber se este é ou não o seu talento, eu digo que o único jeito é percorrer o caminho, fazer um curso, exercitar leituras e depois usar um pouco de bom senso e honestidade consigo mesmo! Aconselho a qualquer um desconfiar dos cursos de formação de tarólogos, ainda mais os rapidinhos.
7º) O método mais eficiente
Com certeza esse mito sempre será criado, tempo após tempo… É muito difícil de derrubar uma coisa dessas! Sempre haverá um autor de mais relevância que criará uma tendência, e sempre haverá seguidores para essa tendência, que divulgarão que os que não a seguem não conhecem a verdade, ou estão equivocados, ou ainda que não são tão bons assim… O único jeito é ficar sempre atento a um fato bem simples: qualquer autor, por mais aclamado que seja, só é capaz de viver a sua própria experiência e tirar o máximo dela, e nisso ele será igual a qualquer um nós! Por mais adeptos que suas ideias alcancem não significa que sejam a melhor visão e muito menos a única a ser seguida. Afinal os que não conseguem se enquadrar nessa “verdade” devem fazer o quê? Desistir do tarot? Nenhum tarot é o definitivo, nenhum método de leitura ou maneira de dispor as cartas é o mais correto ou eficiente. Há inúmeros tarots, métodos e sistemas de leituras, experimente todos até descobrir o seu.
Não se esqueça de que a maravilha do tarot é não ter um dono, fundador, ou inventor reconhecido. Muito menos uma autoridade inatacável quanto a sua aplicação oracular. E essa liberdade permite com que cada um o utilize como quer, diferentemente de outros, e todos usando o mesmo instrumento! Ninguém está livre de ser questionado ou contestado não importa o tamanho da bibliografia a que ela (ou ela) tenha se dedicado a dissecar, nem quantos museus tenha visitado. Somos todos pessoas compartilhando nossa visões interiores e transmitindo esse conhecimento cuja origem apenas em parte é humana e racional.
JAIME E. CANNES
Publicado no Clube do Tarô em Fevereiro de 2011